Pesquisar este blog

30.6.03

Já deveria ser um conceito introjetado em mim o de que não existe obviedade. Isso desde o tempo em que eu, tímida, deixava de responder às perguntas da professora por achar que o que eu tinha para dizer era tão óbvio que não poderia ser aquela a resposta. A seguir, via um coleguinha levantar o braço e falar o que tinha passado pela minha cabeça (e sido engessado pelo meu senso crítico), levando os elogios e, algumas vezes, o prêmio. Pois se não existe tal coisa, resta-me pouco senão ulular.

Você provavelmente jamais ouviu falar sobre este caso, do dia 26 de maio. Ele rendeu pouco mais que pequenas notas em alguns jornais. Mas, da mesma forma, é quase certo, soube deste outro aqui, do dia seguinte e que ganhou as primeiras páginas de praticamente todos os jornais do país. Qual a diferença básica entre os dois? Um aconteceu em Guaraciama – MG e outro no Rio de Janeiro.

Diz Heloisa Seixas num trecho de carta endereçada à memória de Zozimo:

“Talvez você já saiba que as notícias não são lá muito boas. Pensei em começar dizendo que apesar de tudo o Rio continua lindo, mas sustei a pena, primeiro porque seria um clichê e depois porque isso você vê todos os dias, apesar de estar distante. (...) Nosso Rio, meu caro, tornou-se de repente um símbolo do mal. (...) A imagem da cidade foi associada à violência, de forma taxativa. É estranho porque, embora a violência seja inegável, há dados que deveriam nos fazer, a todos refletir. (...) O Rio está em sétimo lugar em número de homicídios, oitavo lugar em número de assaltos com morte, quinto lugar em números de mortes violentas. Sua “melhor” colocação nesse ranking macabro é um segundo lugar em número de roubos de carros.

Por que então essa satanização, esse linchamento moral?

(...)O clichê pega, ganha força, vida própria, começa ser repetido automaticamente, sem reflexão. Até que todos acabam acreditando. Se a lenda for mais forte que a verdade, que se publique a lenda, disse o personagem de um filme antigo, do qual você deveria gostar.”


E eu boto a cara pra fora de casa num domingo ensolarado no Rio. E entro, mas não encaro até o final, na fila enorme para visitar o Corcovado; abraço de novo o Largo do Boticário (mais aqui); paro na Urca para uma olhada na vista e na procissão de barcos em homenagem a São Pedro, um papinho com um pescador calouro e um pastel na feira livre; viajo na arquitetura do Centro; me perco em deslumbramento pelas salas do CCBB; me delicio no Nova Capela; surto um pouquinho na Babilônia Feira Hype e faço uma tatuagem; vou sambar no Estephânio’s e ainda alcanço o rabicho da Marcha do Orgulho Gay. E pela janela do carro, daqui pra lá e de lá pra cá... bem, se você não sabe, eu sinto muito por você...

Onde mais tudo isso no mesmo dia?

Será que fui óbvia o suficiente, ó urubulinos de plantão?

Nenhum comentário: