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26.2.03

Li este texto durante as férias e pensei no quanto gostaria de tê-lo por aqui. Cheguei a guardar o jornal onde ele estava, mas ficou em algum ponto do tira e põe coisas na mala. A impressão que as informações que ele traz ficaram em mim, mas depois que voltei, acabei encontrando outras coisas e deixei prá lá. Só que certas coisas precisam ser de conhecimento do maior número de pessoas possível, então ele acabou caindo na minha caixa postal e agora divido com você.


A MUNIÇÃO SUJA DE MR. BUSH
Texto de Fritz Utzeri - Jornal do Brasil 19/01/03
Caderno B - Fls. B1 e B10


Saddam Hussein é um mau defunto pra se queimar vela, mas o seu inimigo George W. Bush não fica muito longe dele. É impossível comparar a biografia de um e de outro. Saddam é um assassino, mas é possível dizer que, na História e no contexto político e social dos EUA, Bush Filho é a coisa mais próxima de Saddam. Foi eleito num pleito discutível e desde os atentados de 11 de setembro tem procurado rasgar liberdades civis que são a marca e a razão da existência da nação norte-americana.
De que é acusado Saddam? De fabricar e esconder armas de destruição em massa. Saddam usou esse tipo de armas não contra os americanos na Guerra do Golfo, mas contra os curdos ao norte do país, que foram impiedosamente massacrados com gás letal. Agora, os inspetores da ONU acharam velhas ogivas capazes de conter gases venenosos. Segundo os iraquianos, as ogivas foram compradas há muitos anos e estão obsoletas, esquecidas.
Verdade ou mentira, o fato é que Saddam foi armado (inclusive com gases letais e antrax) por americanos e soviéticos e seu programa nuclear teve ajuda francesa até ser detonado por Israel. Até o Brasil esteve implicado no desenvolvimento de seus mísseis Scud. Mais recentemente, fomos acusados de contrabandear material radioativo para o Iraque, mas a venda foi feita quando Saddam ainda era o queridinho do Ocidente, o inimigo mortal dos Aiatolás. Para achar esse tipo de armamento no Iraque, armas selvagens que deveriam ser proibidas pela Convenção de Genebra, basta dar uma olhada no arsenal americano. Poder-se-ia alegar que os americanos são responsáveis, mas isso não é verdade. A começar pelas bombas atômicas, os EUA têm, consistentemente, usado todas as armas de que dispõem. Em Hamburgo, na Segunda Guerra Mundial, onde era fácil distinguir os mocinhos dos bandidos, os americanos bombardearam a cidade com bombas de fósforo. Os civis atingidos pegavam fogo e corriam para o rio e o mar. Dentro d água o efeito cessava, mas, assim que emergiam para respirar, as vítimas tornavam a pegar fogo, até morrer.
No Iraque a ação desse tipo de arma é mais insidiosa e ainda mais duradoura e devastadora. A mais sinistra e covarde arma dos americanos é o urânio empobrecido, ou urânio 238, resíduo da fabricação de bombas atômicas. Durante a Guerra do Golfo, George Bush (pai) autorizou o uso de urânio empobrecido contra a população civil iraquiana. Essa substância leva ao câncer terminal 99,5% dos atingidos por sua ação, num período entre cinco e 40 anos. Ela foi usada também na ex-Iugoslávia, no Kossovo e na Bósnia. Depositado nos pulmões ou nos rins, o urânio 238 e os produtos de sua degradação (tório 234, protactínio e outros isótopos de urânio) emitem radiações alfa e beta que causam, ao longo dos anos, câncer nos indivíduos expostos e anomalias genéticas em seus filhos e netos. Nos 110 mil ataques aéreos contra o Iraque, desde a Guerra do Golfo, os aviões A-10, dos EUA, dispararam 940 mil projéteis sujos, revestidos com urânio. Na ofensiva terrestre da Guerra do Golfo, os tanques americanos dispararam 4 mil projéteis revestidos de urânio. Estima-se que na área dos bombardeios haja 300 toneladas métricas de detritos radioativos, que já podem ter contaminado cerca de 250 mil iraquianos.
Além de continuar bombardeando o país durante os governos Clinton e George W. Bush, os americanos proibiram os países da comunidade internacional de ceder ou vender ao Iraque os equipamentos necessários para limpar a água, o solo e o ar desses contaminantes radioativos.
Os norte-americanos vêm usando urânio para revestir sua munição convencional na artilharia, em tanques, mísseis e aviões desde 1977. O urânio é altamente radioativo e deveria ser guardado em depósitos seguros para evitar a contaminação. A vida média desse urânio é de 4.500 anos. Ou seja, ele permanecerá ativo, matando e aleijando até o ano 6.500, em pleno século 25! O uso desses materiais em armamentos foi recomendado para cortar custos. Os depósitos americanos estão cheios de urânio empobrecido e os departamentos de Defesa e de Energia cedem esse material a fabricantes de armas dos EUA, Reino Unido, França, Canadá, Israel, Taiwan, Coréia do Sul, Paquistão e Japão, que produzem munição com esse material.
Quando uma bala ou bomba suja atinge o seu alvo, 70% de seu revestimento de urânio queima e se volatiliza em partículas altamente radioativas. Essas partículas podem ficar depositadas no solo, ser carregadas pelo vento e contaminar gente, mananciais e se integrar na cadeia alimentar, causando estragos imensos durante milênios.
Só para dar uma idéia, a Organização das Nações Unidas para a Infância (Unicef) calcula que na década de 90, como conseqüência da Guerra do Golfo, a incidência de câncer em crianças quintuplicou no Iraque. Sinistramente, ao mesmo tempo em que denuncia o problema, a ONU impede o Iraque de importar medicamentos, no caso radioisótopos, material nuclear usado para as radioterapias no tratamento de certos tumores, sob o pretexto de que Saddam poderá fabricar armas a partir dos remédios! Assim, em conseqüência dessa política cruel, a guerra e o embargo já mataram pelo menos 500 mil crianças. Ainda hoje morrem entre 4 e 5 mil crianças todos os meses devido a males causados pelo conflito, incluindo o urânio 238.
Segundo a Anistia Internacional, morrem 12 crianças por hora no Iraque. Até hoje os hospitais estão cheios de pacientes e não têm condição sequer de estocar vacinas, pois a geração e a distribuição de eletricidade é precária e o embargo não permite a importação de equipamento para normalizar o fornecimento de energia elétrica e água, com o argumento de que o Iraque poderá usar essa energia para fabricar armas. Mas não são apenas os iraquianos que sofrem. Os americanos veteranos da guerra vêm sendo vítimas de doenças de diagnóstico difícil, tais como imunodeficiências semelhantes à Aids. Tanto entre os iraquianos como entre os veteranos americanos e ingleses, registram-se sintomas de um mal conhecido como Síndrome da Guerra do Golfo. O câncer e o nascimento de crianças com deformações físicas são cada vez mais numerosos. Os mesmos sintomas afetam mais de mil crianças na antiga Iugoslávia, onde os aviões da OTAN jogaram bombas sujas com urânio. Convém lembrar que a Iugoslávia fica na Europa. Imaginem os armamentos que Bush Filho vai usar na guerra que vem aí. Ele precisa:
1) modernizar seus arsenais;
2) renovar as encomendas à indústria bélica dos EUA, da qual depende grande parte de sua economia e;
3) testar novos armamentos.

A guerra será ganha rapidamente, o petróleo será controlado e os americanos dizem que vão democratizar o país em 18 meses. Seria bom, nesses momentos, pensar como um árabe e islâmico antes de agir. Eles estão se vendo invadidos pelos infiéis em outra cruzada (Bush Filho já escorregou ao usar o termo). O ódio dos árabes ao Ocidente tornará o mundo cada vez mais inseguro, até que o terrorismo não oficial comece a usar as mesmas bombas e balas sujas que os terroristas americanos usam contra os civis iraquianos em nome do combate ao terrorismo. Só quando as crianças afetadas forem americanas ou inglesas, ou seja, brancas, o mundo acordará em comoção e lágrimas e falará em selvageria, pois, como já está provado, nem todos os seres humanos são iguais.

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