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25.9.01

Capítulo II

Era a festa de inauguração de uma nova academia de dança. Uma colega dos velhos tempos era a proprietária e enviou o convite para Helena. Ela não perdia nenhum evento social. Adorava ver e ser vista. Gostava muito de conversar com as pessoas, em especial aquelas que pertenciam ao seu mundo.

Por algum motivo que ela desconhecia, caprichou mais do que o normal na própria produção. Antes de sair conferiu o resultado no espelho e aprovou.

Chegou um pouco atrasada, o lugar já estava cheio de gente e ela tentava chegar à anfitriã, mas parava aqui e ali para cumprimentar um e outro conhecidos. Ela era muito popular. Ninguém jamais esquecia seu nome ou seu rosto.

Finalmente, alcançou a amiga e congratularam-se com entusiasmo. Helena estava realmente feliz com a realização do sonho da companheira e por estar ali, em seu habitat natural, cercada de gente, espelhos e barras.

- Eu quero muito que você conheça o meu irmão, disse a amiga. Fred, ô Fred, vem cá. Quero te apresentar à Helena, aquela minha colega dos tempos da escola de dança, que eu te falei. Helena, este é o Fred, meu irmão.

O olhar de Fred incomodava Helena. Era diferente dos olhares a que estava acostumada. Ele olhava para a sua boca enquanto ela falava. Helena tentava desvencilhar-se dele e ele continuava um assunto sem pé nem cabeça. Perdia-se no seu decote. Ela disse que ia pegar alguma coisa para beber e ele segurou o garçom pelo braço e perguntou o que ela ia querer. Entregou-lhe o copo de vinho branco e conduziu-a até uma das mesas. Observou discretamente o caimento de sua saia enquanto ela cruzava as pernas.

- Você é amiga da mana há muito tempo?
- Continua trabalhando com balé?

Ela estava assustada.

- Desculpa, mas preciso mesmo falar com algumas pessoas. A gente se fala mais depois, tá?

Ela levantou-se e começou a andar para longe dele. Ele alcançou a mão dela e disse que só deixaria que ela se perdesse na multidão depois de lhe autorizar a pegar o número de seu telefone com a irmã. Ela não tinha experiência com estas coisas. Concordou e saiu quase correndo.

Ele ligou no dia seguinte. E no outro e no outro e outros mais até que ela concordasse em encontrar-se com ele. Era preciso que se conhecessem melhor, ele dizia. Helena foi perdendo o medo e conhecendo um outro tipo de sentimento que ela ainda não conseguia entender o que era. Ele, sem a presença física e aquele olhar, não era tão assustador, afinal. Conversava sobre coisas interessantes e era bem gentil. E era irmão de uma de suas amigas mais antigas. Não havia o que temer, tranqüilizava-se.

Ela queria ir ao cinema, mas ele insistiu que fossem a algum lugar onde pudessem conversar.

Na verdade, eu queria um lugar onde pudesse olhar bem para você, ele disse quando finalmente se encontraram. Ela começou a ficar assustada de novo, mas ele logo percebeu. Disse que ela não precisava ter medo. Ele só estava encantado por ela. Ela era perfeita. Ela era maravilhosa.

Helena nunca tinha ouvido nada parecido com tanta sinceridade. Ele parecia realmente gostar dela. E conversa seguiu leve. Ela estava se sentindo à vontade com ele. Riram juntos. Ele contou uma versão resumida de sua história e prestou bastante atenção quando ela contou a dela.

Quando chegaram à porta da casa dela ele inclinou-se para dar-lhe um beijo. Ela virou o rosto, sem jeito. Ele perguntou por que não e ela respondeu que não sabia. Helena nunca tinha sido beijada antes.

Ela pensou que depois disso ele jamais a procuraria novamente, porém outros telefonemas vieram e eles se encontraram novamente. Ele trouxe flores. Ele disse que queria namorá-la. Ela jamais poderia sonhar com homem mais romântico. Ela contou que jamais havia namorado. Ele disse que não entendia o que os outros rapazes tinham na cabeça, que ficaria muito honrado em ser seu primeiro namorado. Ela viveria mil anos e jamais esqueceria a sensação daquele beijo. Ela estava apaixonada.

Fred seguia o roteiro dos sonhos de Helena. Ele era muito carinhoso e paciente com as resistências dela. Sabia ouvi-la. Sabia encantá-la. Sabia conquistar seu coração.

Três meses transcorreram desde o primeiro encontro. Ele fez o convite. Ela já estava tomando pílula há um mês. Foi mais lindo do que ela jamais imaginara.

O tempoia passando e ela estranhava o fato de sempre estarem sozinhos. Eles não saiam com outros casais e ele jamais falava sobre seus amigos. Ela imaginava que ele devia gostar de ficar o tempo todo com ela, sem ninguém para atrapalhar. Entretanto, sentia falta de estar com outras pessoas em festas e lugares da moda, como era seu hábito antes de conhecê-lo. Insistiu tanto nisso, que depois de algum tempo, mesmo sob protestos, ele acabou cedendo.

Foram a uma casa noturna que tinha aberto suas portas recentemente e já atraía aquela turma de que ela gostava tanto. Ao contrário do habitual, ele não estava segurando sua mão, nem mantinha o braço sobre os ombros dela. Aqui está cheio demais e ele quer me deixar livre para circular, ela pensou. Encontrou muitos conhecidos e ficou contente em estar de novo em circulação. Era bom estar em contato com aquele ambiente novamente.

- Você não conhece ninguém por aqui, tchutchuquinho?
- Por enquanto não vi ninguém conhecido.

Neste instante alguém tocou o ombro dele e ele virou-se.

- E aí, campeão? Há quanto tempo! Como é que estão as coisas, Fred? Você anda sumido, cara! Garimpando mais alguma peça para a sua coleção?
- Tudo bem. Esta aqui é a Helena. Helena, este é o João.

O amigo de Fred lançou sobre ela o olhar familiar, aquele que o namorado quase a fizera esquecer que existia. Estava visivelmente alcoolizado e conquistou de imediato a antipatia da moça. João sorriu e piscou para o amigo. Aproximou-se do ouvido, mas falou tão alto que ela pode ouvir:

- Você não tem jeito, né?

E afastou-se.

Helena ficou curiosa com a observação de João. E que coleção era essa que Fred jamais mencionara?

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