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4.3.02

Todo mundo que tem filho em idade escolar lembra que antes da dengue outra febre foi soberana. E alguns devem também lembrar que antes de ser politicamente corrigido para enquadrar-se às regras norte-americanas e muito antes de atracar por essas plagas de habitantes tão desesperados por consumir vorazmente tudo o que é moda na terra de Tio Sam, um certo programa andou causando ataques epiléticos. Graças aos seus poderosíssimos estímulos áudio-visuais, durante a exibição de um de seus episódios, diversas crianças, em diversas partes da terra do sol nascente - origem de tão curiosa atração - sucumbiram, literalmente babando, à experiêcia.

Pois hoje descobri que sou o Pikachu, o bichinho elétrico protagonista de Pokémon. Não alcanço qualquer outra razão para explicar a freqüência assusadora com que alguém cai diante de mim debatendo-se absolutamente sem controle sobre os próprios movimentos. Quem já presenciou tal cena sabe que ela não é bonita. E quem tem um pouco de discernimento sabe que não causa qualquer prejuízo a não ser ao próprio doente. O meu desespero é porque não sou daquelas pessoas de iniciativa diante de uma emergência. Minha tendência é a paralisia e o grito. Sangue me apavora. Talvez tudo isso seja uma espécie de chance de aprimoramento, porque geralmente os incidentes que presencio envolvem situações de grande risco.

Numa dessas vezes, um homem caiu numa escada e, com os espasmos, batia fortemente a cabeça na quina de um dos degraus. Para ajudá-lo tive que engolir minha fobia, despertada com toda fúria pelo sangue que escorria de sua boca e de sua testa, já que ninguém mais se prontificou a fazê-lo. Os policiais que passavam e a quem pedi socorro deram de ombro e disseram trata-se de um bêbado conhecido na vizinhança. Mais medo que de sangue, só da polícia... Só sosseguei quando a ambulância dos bombeiros, que chamei de um orelhão próximo, finalmente chegou.

Hoje, por volta de meio-dia, filho pela mão a caminho da escola, outro homem caiu diante de mim numa das pistas da Avenida Maracanã. Mesmo quem não conhece pode imaginar a intensidade e a velocidade do tráfego na hora do almoço em uma via que detém o título de avenida. Deixei o moleque na calçada com instruções de não sair dali e lá fui eu sinalizar para os carros desviarem. O sol quente, um antigo problema de saúde e o susto faziam minha cabeça girar. Agarrei pelo uniforme um gari que passava e o intimei a me ajudar a retirar o homem do asfalto. Uma pequena multidão reuniu-se, o homem já estava em segurança recostado no muro, aparentemente sem maiores ferimentos, minhas pernas paravam de formigar: segui meu caminho tentando explicar ao meu filho o que era epilepsia e aquela outra doença, a mais grave, que faz com que as pessoas virem o rosto em outra direção e finjam que nada acontece.

Acho que o Pikachu fica mesmo bambo depois de descarregar suas baterias...

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